Chrysanthème — pseudônimo de Cecilia Moncorvo Bandeira de Mello Rebello de Vasconcellos (1869-1948) — despontou como jornalista aos 38 escrevendo para o jornal A Imprensa. Seu nome foi apagado da literatura brasileira, seus livros não foram reeditados e dificilmente se consegue encontrar algum exemplar em sebos ou bibliotecas brasileiras.
Sua escrita é provocativa e ela não se deixava subjugar pela opinião masculina. Em seus livros, discutia o casamento por conveniência — muito comum ainda em sua época —, assédio sexual, divórcio, adultério, homossexualidade, voto feminino e suicídio. Estes temas estão presentes em sua obra e nas colunas que escreveu, em jornais, por quase 40 anos.
Chrysanthème fez alguns desafetos durante sua carreira como escritora, entre os mais notáveis estavam Gilberto Amado, que substituiu sua mãe Carmem Dolores, na coluna “A Semana” do jornal O Paiz, espaço que só mais tarde ela viria assinar. Com Lima Barreto, o motivo da desavença foi uma crônica onde nomeou o movimento das mulheres escritoras como uma “igrejinha”, lideradas por Chrysanthème a quem classificou como “quase uma basílica”. A birra de Rui Barbosa surgiu do comentário pejorativo de Chrysanthème em artigo no jornal O Paiz sobre o inflamado discurso do então senador na Associação Comercial do Rio de Janeiro, onde escreveu: “Como os homens se parecem com as mulheres quando se fazem birrentos e manhosos!”
O jornalista Humberto Campos ganhou a animosidade de Chrysanthème pela crítica que escreveu sobre seu livro O que os Outros Não Veem, em que os personagens fogem ao padrão da época. Campos afirma que a autora poderia fornecer à literatura brasileira excelentes romances: “Basta para isso que se proponha a escrever mais sossegadamente e pondo em cena personagens mais asseados com a língua.”
Chrysanthème também fez grandes amigos, como Alcino Guanabara, que lhe abriu as portas para o jornalismo em seu jornal A Imprensa, e o cronista João do Rio, que a classificava como “legendária e desconcertante”.
Cecilia Moncorvo Bandeira de Mello Rebello de Vasconcellos nasceu no Rio de Janeiro em 8 de fevereiro de 1869, filha de Jeronymo Bandeira de Mello e Emília Moncorvo Bandeira de Mello, também jornalista e escritora, que se assinava sob o pseudônimo de Carmem Dolores. Era a segunda filha de sete irmãos. Em 10 de abril de 1888, aos 19 anos, casou-se com o professor Horácio Rabello de Vasconcellos, e um ano depois nasce seu único filho, Henrique Rebello de Vasconcellos.
Ingressou na vida literária aos 38 anos após a morte de seu marido, com incentivo de sua mãe Carmem Dolores, visando ganhar seu sustento. Para lidar com o preconceito da época e se proteger contra a discriminação, Cecilia adotou o pseudônimo, inspirado no título de um livro de grande sucesso na época, do escritor Pierre Loti, Madame Chrysanthème.
Pouco ou quase nada se sabe sobre sua vida privada, mas deixou um grande legado para as futuras gerações. Documentou os costumes da capital da República e seus personagens do ponto de vista de uma mulher crítica e sem amarras. Chrysanthème faleceu no Rio de Janeiro em 22 de agosto de 1948, aos 79 anos, deixando, além do filho, um neto, Alcindo, e dois bisnetos: Henrique e Maria Helena.
As opiniões independentes e depreciativas das transformações por que passou a burguesia carioca nas décadas de 1910 a 1940, fizeram com que Chrysanthème fosse ignorada pelos críticos.
Chrysanthème começou a escrever em 1907 e continuou ininterruptamente até sua morte em 1948. Adotou uma linguagem nova e agressiva. Foi ferrenha defensora do trabalho da mulher, independente da classe social, e uma violenta crítica da ociosidade, futilidade, vaidade excessiva. Defendia a educação feminina e a participação da mulher na vida política brasileira pelo voto.
Como jornalista escrevia textos ferinos, irônicos e críticos, discutindo sempre a condição da mulher e questões políticas e sociais. Valorizava o trabalho da mulher, incentivando-as a buscar independência financeira e social.
Começou a escrever no jornal A Imprensa e não parou mais até sua morte. Sua última crônica foi publicada alguns dias antes de sua morte, em 6 de agosto de 1848, com um título sugestivo: “A Câmara em Cuecas...”
No jornal O Paiz foi onde permaneceu por mais tempo, com a coluna “Palestra Feminina” (1915-1921) e depois em “A Semana” (1921-1934). Com o incêndio criminoso que destruiu o prédio de O Paiz, o jornal deixou de circular e Chrysanthème migrou para o Diário de Notícias (1935-1943) e Gazeta de Notícias (1938-1948). Chrysanthème manteve ainda colaboração regular nos periódicos: Correio Paulistano, O Mundo Literário, Única, O Cruzeiro, O Malho e O Imparcial, além de colaboração esporádica em inúmeras outras publicações como: Revista Feminina (SP), Jornal Pequeno (PE), Vida Doméstica, Walquirias (RJ), Beira Mar (RJ), Dom Casmurro (RJ), Brasilidades (SP).
A professora e pesquisadora Maria de Lourdes de Melo Pinto fez um importante trabalho de catalogação das matérias publicadas nestes periódicos, contabilizando mais de 1500 crônicas.
Na literatura, Chrysanthème desenvolveu uma estratégia própria para atrair leitores e vender seus livros, criando títulos de impacto para suas obras. Um exemplo é o livro Matar!.
Seus livros tratam de temas que não eram “politicamente corretos” serem abordados, ainda mais por uma mulher, como erotismo, sexualidade, adultério, homossexualidade, fanatismo religioso, assédio sexual, suicídio e inúmeros temas “tabus” do início do século XX. A Primeira Guerra Mundial provocou uma enorme transformação na vida das mulheres na Europa e dos Estados Unidos, com reflexos também no Brasil. O cinema deu grande contribuição para estas mudanças. As mulheres cortaram os cabelos, encurtaram e ajustaram os vestidos. Começam expressar suas próprias ideias e não somente repetir o pensamento do pai ou do marido. Chrysanthème retratou em seus livros estas transformações e novos hábitos da sociedade carioca.
Infelizmente, Chrysanthème foi apagada da nossa literatura, não se sabe se por preconceito ou por viver do seu trabalho. Suas obras, ao que se tem notícia, não foram reeditadas após sua morte, com exceção do livro “Enervadas”. Em paralelo, as edições originais são muito difíceis de serem encontradas, mesmo nas nossas bibliotecas. Uma delas é Memória de um Patife Aposentado, publicado pela Editora Leite Ribeiro. A escritora, em uma de suas colunas “A Semana” critica o editor pela demora da publicação e pelo pouco destaque que dá ao livro pelo fato de ser a história de um gatuno que roubava galinhas numa cidade do interior, se torna um ladrão requintado na Capital da República.
Segundo pesquisadores, Chrysanthème começou sua carreira em 1906 com o livro infantil Contos Azuis — não conseguimos confirmar esta data. No obituário que a Gazeta de Notícias escreveu quando da morte de Chrysanthème citam três obras que não temos nenhuma outra referência: o livro infantil Contos Cor-de-Rosa e as peças teatrais A Comediante e Esses Homens.
As informações que publicamos sobre os livros baseiam-se em informações dos jornais da época e dados levantados por pesquisadores. Chrysanthème deixou ainda duas obras inéditas: Torpeza e Memória de uma velha, no prelo da Editora Pongetti, mas que não temos notícias de que tenha sido publicado.
1906 ― Contos Azuis – reúne 12 contos infantis, de acordo com a edição de 1922
1911 – Diário de um colegial – publicado como folhetim em A Imprensa, posteriormente foi transformado em livro.
1911 — Almas Femininas – novela publicada em folhetim em A Imprensa.
1921 ― Flores modernas – primeiro romance publicado pela autora, retratando as transformações por que passavam as mulheres e o aparecimento das melindrosas. Reeditado pela Janela Amarela
1922 ― Enervadas – obra mais reeditada que trata do emponderamento feminino foi publicada na Semana de Arte Moderna
1923 — Uma estação em Petrópolis – publicado pela Editora Leite Ribeiro
1923 — Uma paixão – romance publicado em folhetim em O Paiz em 1922/1923
1924 ― Mãe ― romance
1924 ― Memórias de um patife aposentado (1924)
1924 — Almas em desordem – romance
1926 — Vícios modernos ― romance
1925 — História de São Paulo – livro infantil
1927 — Matar! ― romance — assédio, prostituição, e suicídio estão no centro da obra. Reeditado pela Janela Amarela
1929 — Minha terra e sua gente, romance publicado pela editora João do Rio
1929 — O que os outros não veem — romance publicado em folhetim pela Gazeta de Notícias em 1926 e o livro foi lançado três anos depois pela Francisco Alves.
1933 ― Famílias ― romance publicado pela Renascença Editora
1934 — Cartas de amor e de vício — publicado pela Editora Calvino Filho
1935 — A mulher dos olhos de gelo – romance gótico, que fala sobre feminicídio e fanatismo religioso. Reeditado pela Janela Amarela
1936 ― A infanta Carlota Joaquina – da Editora Moura Fontes & Flores
Em nossas pesquisas identificamos que Chrysanthème lançou também obras para o teatro: A Datilógrafa (1911) e Gritos femininos (1922)